Este post é a continuação de A Aeromoça. Até porque o
título assim sugere. Portanto, para entender o que se passa leia primeiro: A Aeromoça
Rodrigo não
entendia o porquê de estar sendo preso. Os Policiais Federais não diziam que
ele estava sendo preso, mas sim detido. Rodrigo pensou que pouca diferença
fazia em ser preso ou detido, afinal não podia sair daquela sala...
- Que papelão cidadão. Fiquei sabendo que o
senhor deu um piti no voo Rio-Paris. Eu estava em casa e tive que vir até aqui para resolver esta situação.
- Cidadão,
falando assim parece tudo normal. Mas o que tenho aqui registrado na ocorrência
é um pouco mais, digamos assim, ousado. Só para relembrá-lo, o senhor tentou
colocar as mãos nas partes íntimas da aeromoça.
- Dr. Delegado,
tenho que lhe corrigir somente em um ponto. Não era uma aeromoça, poderia ser definido, "digamos assim", aeromoço. Rodrigo tentou imitar o tom de voz do Delegado quando pronunciou o "digamos assim".
O Delegado não gostou muito o tom usado por Rodrigo. Mas prosseguiu aquela conversa.
- Cidadão,
pouco importa. Não vamos entrar em juízos de valor. Iremos fazer todos os trâmites aqui e depois
encaminharemos este inquérito para a Justiça, lá é o fórum adequado para resolver este
conflito. E aí o senhor expõe "digamos assim" a sua tese sobre a aeromoça. Quando o delegado disse "digamos assim" ele alterou muito a pronuncia. Aquela sala mais parecia um filme comédia pastelão.
Mas Rodrigo queria logo sair dali, portando, só restava fazer o jogo do delegado. E aí falou:
- Concordo. E
o que preciso fazer para solucionar esta questão?
Mais de duas
horas depois foi liberado, entretanto, ainda ouviu uma última frase de outro policial:
- Cidadão, não
vai fazer besteira.
Rodrigo respondeu automaticamente:
- Pode deixar... foi apenas um mal entendido.
Ao sair do
aeroporto, Rodrigo foi direto ao primeiro shopping que encontrou. Procurou a
loja mais chique do shopping e começou olhar algumas roupas. A atendente da loja
muito solicita se aproximou e perguntou:
- Está
procurando alguma coisa em especial?
- Sim.
- Posso lhe
ajudar?
- Claro.
Gostei muito daquele conjunto ali. Você tem tamanho G.
- Não sei...
Mas senhor.
Rodrigo logo percebeu a confusão que se estabelecia na cabeça daquela atendente. E esclareceu logo a situação. Pelo menos para manter a aparência das coisas:
- A senhora
entendeu mal. Não se preocupe é para minha esposa.
- Por um
momento cheguei a pensar que era para o senhor.
A atendente
deu uma risada aliviada. Rodrigo por seu lado sorriu discretamente. Seu plano
começava a tomar forma. Carlinhos ia ver só.
Depois Rodrigo foi procurar um hotel. Tinha que ser próximo ao aeroporto. Logo achou o
hotel ideal. Depois de registrar-se, foi logo para o quarto e fez uma pesquisa
básica na internet sobre os próximo voos vindo da França. Rodrigo, ainda, pesquisou sobre os horários dos voos, sobre quais são os intervalos mínimos que
devem ser respeitados por cada tripulação entre voos. Rodrigo tornou-se, em
poucos minutos, um especialista em direitos dos trabalhadores no
setor da aviação. Rodrigo mais uma vez agradeceu ao "Deus" google.
Após toda esta pesquisa, Rodrigo calculou que na próxima sexta-feira, Carlinhos
faria o voo 5578 Paris-Rio. E então o seu plano seria posto em prática. Agora
era treinar para convencer.
Finalmente,
chegou a sexta-feira. Era o grande dia. Rodrigo se prepara com todo o cuidado, pensou em todos os detalhes. Mas teria que
fazer o primeiro teste valendo. Treinou muito na frente do espelho, mas era tempo de testar na vida real. Iria falar com o atendente da portaria do
hotel. Rodrigo deixa seu quarto, entra no elevador, admira-se no espelho, preparava a voz e,, após sair do elevador pergunta ao atendente:
- Por favor
onde tem um ponto de táxi? Preciso ir ao aeroporto.
- Senhora o
ponto fica na próxima esquina. Se quiser posso chamar um táxi
O atendente vê
aquela mulher saindo. Pensa. Muito estranho, não lembro dela se registrando aqui. Eu iria perceber esta mulher diferenciada. Ao olhar para a mulher caminhando daquele jeito estranho, que mais parecia... um
homem, espera aí este é o cara que se hospedou no 701. Cruz credo. O que está havendo com este hotel?
Rodrigo sai caminhando
de forma pouco convencional para dizer o mínimo. Estava montado como dizem a Drags. Mas era por
uma boa causa. Iria desvendar aquele mistério. Chegando no ponto de táxi entra no primeiro da fila e pede para ir até o aeroporto.
O motorista ao
olhar pelo retrovisor achou aquela mulher bonita, mas tinha algo estranho, um certo mistério. Não sabia
o que era, mas pouco importava. Mais uma corrida curta. O dia não era bom. Pelo
menos tinha uma bonita mulher no seu táxi.
- Senhora,
chegamos. A corrida ficou em 15 reais.
Rodrigo, pegou
a carteira e logo percebeu a primeira falha do seu plano. A carteira era de
homem.
O taxista
pergunta:
Desculpe a indiscrição, mas qual a sua
graça?
Rodrigo não
havia pensado em um nome. Outra falha no plano. Não sabia que nome dizer, falou
o primeiro nome que lhe veio na cabeça.
- Meu nome é
Rogéria. Pode ficar com o troco. E desce do táxi com alguma elegância. Parecia que começava a pegar o jeito. Era só dar uma pequena rebolada...
Ao dar os
primeiros passos o coração de Rodrigo começa a acelerar. As pernas começam a tremer, mas agora não tinha como
recuar. Rodrigo, ou melhor, Rogéria anda com alguma desenvoltura e parece que todos os homens estão observando o seu caminhar, chegam até a virar o rosto. Mas ele não podia perder o foco. Concentrou-se ainda mais e continuou a caminhar em direção ao
desembarque internacional. Era só questão de tempo para começar a parte mais
importante do plano. Alguns longos minutos se passam e os passageiros do voo
5578 Paris-Rio começam a descer. Muitos minutos depois aparecem os primeiros
membros da tripulação. E ao final vem quem ele tanta esperava. Carla ou Carlinhos, o plano enfim seria colocado em
prática. Por sorte, ela caminha sozinha ou seria sozinho, pouco importa. Era o
momento, não poderia recuar, iria abordar o Carlinhos. O coração bate descompassado.
- Perdão,
estou perdida. Espero um parente que não desceu do voo. Ele vinha no mesmo voo que a senhora trabalhou, o voo dele era o 5578 procedente de Paris, o nome dele é Carlos
Moreira. Por um acaso a senhora poderia me ajudar.
Aquela bela
aeromoça não entendeu o nome proferido e questiona:
- Não entendi
o nome que a senhora falou.
Rodrigo sorriu
por dentro. Pensou, claro o nome que eu disse é o teu nome, mas respondeu com uma voz ainda mais envolvente:
-
Perfeitamente. Eu estou esperando Carlos Moreira, será que a senhora sabe se ele veio neste voo.
A aeromoça
imaginou que era uma brincadeira. Mas não revelou nenhuma reação e apenas
respondeu:
- Este tipo de
informação não temos acesso, a senhora deve procurar o balcão da companhia. E
começou a caminhar em direção da saída.
Rodrigo sentiu
que Carla, ou melhor, Carlinhos havia titubeado quando ouvi aquele nome... Carlos
Moreira.
- Desculpe-me,
só mais uma pergunta.
A aeromoça se
vira e encara aquela elegante mulher.
Rodrigo olha
nos olhos de Carlinhos e fala:
- Por quê?
- Por que o
quê?
- Por que você me fez passar por aquele vexame no voo de ida à França? Fui preso, a Polícia
disse que na verdade fui detido, mas eu acho que fui preso mesmo. Te pergunto,
por que não me disse quem você é, queria apenas confirmar que teu nome é Carlos Moreira, nada mais.
- Como assim?
Você é o Rodrigo? Aquele louco passageiro do voo de ida à França
- Claro. É o que mais quero.
Então aquelas duas
mulheres se dirigem à praça de alimentação. Parecem duas
amigas de infância. Sentam e pedem dois cafés. Enfim, a conversa é iniciada.
- Rodrigo.
Tenho que te dizer que o Carlos Moreira morreu faz uns 15 anos. O que mais tu quer saber?
Rodrigo tenta
esconder sua surpresa e pergunta:
- Esta morte
que você fala é no sentido figurado?
- Mais ou
menos.
- Você pode
ser mais clara?
- Antes de
qualquer coisa Rodrigo, posso te fazer uma pergunta? É estranho te chamar com o
teu nome, se tu está vestida de mulher.
Rodrigo não
poderia perder a oportunidade, era o momento de colocar os pingos nos "is":
- Agora tu
entende o que senti no voo, como foi estranho ver um colega de colégio vestido
de mulher. Mas deixa para lá e pergunte o que tu quiser.
Carla olha Rodrigo dos pés a cabeça e pergunta:
- Como tu se
sente vestida de mulher?
- É estranho, mas confesso que me sinto muito bem, parece que esta roupa faz parte de mim, sinto que
sempre quis me vestir de mulher. Mas nunca tive coragem e ao te ver no avião
este meu desejo se revelou mais forte em mim, talvez por isso tenha me descontrolado tanto.
- Vou te explicar o que tu está sentido. Já
ouviu falar em crossdresses? Parece que é o que tu gosta, simples assim. O que
aconteceu no avião foi o estopim para a tua liberação. É o que sinto ao te ver
assim, vestida de mulher e com toda esta desenvoltura. O termo crossdresses foi importado dos Estados Unidos para o Brasil mais ou menos em 1997 e numa tradução livre significa "vestir-se ao contrário". Nos Estados Unidos e Europa este termo é muito usado e ajuda a diferenciar a fantasia de usar roupas do sexo oposto das opções sexuais de cada um.
- Espera um pouco. Me vesti de mulher para descobrir quem tu é. Minha intenção era confirmar que tu estudou comigo e que teu nome é
Carlos Moreira. Só isso. Não gosto de me vestir de mulher, é a primeira vez que
faço e era para descobrir quem tu é realmente.
- Bem, mas antes tu falou que estava gostando de vestir-se de mulher. Mas vamos esclarecer logo a situação, vou
te mostrar meus documentos.
- Carlinhos...aqui não. Estamos em um lugar público. Não fica bem, podemos ser presos ou seria detidos, presas ou detidas...
A aeromoça
abre a bolsa e retira o seu documento de identidade.
- Dá uma
olhada aí no meu documento e tire as tuas dúvidas. Lê o nome e os demais dados. Talvez você acredite...
Rodrigo olha
aquele documento onde consta o nome... Carla Moreira Loureiro, sexo feminino,
nascida em Bacabal, data de nascimento 20 de outubro de 1975. Ele não entendia
mais nada, mas ainda teve forças para balbuciar:
- No avião no meio da confusão tu disse que
nem conhecia Bacabal e que sempre morou em Brasília...
- É verdade,
apenas nasci em Bacabal e fui registrada lá, mas sai com poucos dias para morar
em Brasília. Sou irmã do Carlos Moreira, mas como te disse antes ele morreu faz mais
ou menos 15 anos. Desculpe te falar assim, mas tenho que ser sincera.
- Então
confundi as coisas. Mas tu é muito parecida com o Carlos, claro vocês eram
irmãos...
- Desculpa, acho que já esclarecemos as coisas, agora tenho que ir embora meu marido está chegando e casualmente ele é o piloto e fazemos sempre parte da mesma tripulação, trabalhamos juntos.
- Carla,
espera um pouco. No teu documento não consta a averbação de casamento nenhum...
- Tu é muito
observador, ou melhor, observadora. Me diz uma coisa que nome te chamo? Acho
que não fica bem te chamar de Rodrigo com estas roupas de mulher.
- Pode me chamar
de Rogéria. Mas me diz por que não consta a averbação do casamento na tua
identidade.
- Simples, Rogéria. Nos
casamos em Buenos Aires. E Não é possível averbar casamento realizado no
exterior. Me desculpe, mas tenho que ir mesmo. Estamos muito cansados. Tchau.
Rogéria levanta e vai em direção ao saguão, mas uma palavra não saia da sua cabeça, crossdressers. Será
que ele era um destes caras. Iria vestido de mulher até o hotel e depois decidiria o que faria. Uma coisa era certa ele estava gostando muito de se vestir de mulher.
No outro lado
da praça de alimentação, Carla e o piloto se beijam e conversam sobre o encontro
daquelas duas mulheres:
- Otávio tu
não vai acreditar, aquela mulher é o Rodrigo, o homem que fez o escândalo no
voo de ida para a França.
- Mas ele
estava vestido de mulher. Não era uma mulher? Não estou entendendo mais nada.
- Otávio, logo
tu com estes preconceitos. Às vezes parece que não te conhece direito. Depois de tudo que passamos.
Neste momento
Carla dá um pigarro e emposta a voz novamente. Sempre tem estes deslizes na voz
quando algo fora do normal é vivenciado. O dois se beijam e se olham com
cumplicidade. A história dos dois é cheia de cumplicidade. Talvez esteja
começando uma nova história, desta vez sendo escrita por Rodrigo ou seria Rogéria...
Trilha sonora
Un Millon De Años Luz - Soda Stereo - Cancion Animal
Don't Answer Me - The Alan Parsons Project - The Ultimate Collection (Disc 2)
Cancion Animal - Soda Stereo - Cancion Animal
Rondó do Capitão - Secos & Molhados - Coletânea
A Saucerful Of Secrets - Pink Floyd - A Saucerful Of Secrets
Another Harry's Bar - Jethro Tull - Roots to Branches
(En) El Septimo Dia - Soda Stereo - Cancion Animal
Have You Never Been Mellow - Olivia Newton-John - Rock 70´s
I Got You Babe - Sonny & Cher - Rolling Stone Magazine's 500 Greatest Songs Of All Time
Humble Me - Norah Jones - Feels Like Home
Captain Fingers - Lee Ritenour - The Best Of Lee Ritenour
Sing For Absolution - Muse - Absolution Tour
Summer Rain - U2 - 7
Flip The Switch (Clean Version) - The Rolling Stones - More For Promotional Use Only
Love Is Blindness - U2 - Achtung Baby
Everything's Not Lost - Coldplay - Live 2003
Tomorrow (Common Ground Remix) - U2 - October (2008 Bonus)
1990 - Soda Stereo - Cancion Animal
Sueles Dejarme Solo - Soda Stereo - Cancion Animal
De Musica Ligera - Soda Stereo - Cancion Animal
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