Pular para o conteúdo principal

Domingos de todos nós

     O cotidiano por vezes é incrível.
     Como sempre faço aos domingos, me acordei bem cedo e sai para caminhar pela cidade. Gosto do clima de domingo, gosto de andar sem rumo pela cidade que foi dormir tarde e vai acordando aos poucos.
     Caminhar por lugares diferentes me desperta a curiosidade. Sempre gostei de caminhar sem rumo, ainda mais num domingo como qualquer outro. Hoje passei por uma parte da cidade onde a música estava sendo executada a todo volume. Aquelas batidas típicas de festas estavam pulsando, reverberando por ruas desertas. Apenas eu caminhando e envolvido pelas batidas compassadas da música. Latinhas de cervejas, garrafas quebradas, pessoas jogadas pelos cantos. Ao largo observo uma casa noturna, pessoas dançando, fumando, conversando como se fora o início da noite, a procura de uma felicidade perdida em algum canto de suas vidas. Isso oito e pouco da manhã. Fico sempre impressionado com a disposição de quem se propõe a dançar uma noite toda e mantém a mesma disposição numa manhã fria. Conversei com um taxista que estava parado em frente, entre risadas me assegurou que a festa iria até quase meio-dia. Admiro aquelas pessoas que procuram a sua porção de felicidade como se fora a única coisa importante na vida. Será que não é?
     Continuo sem rumo, numa caminhada típica de domingo. Passo por ruas desertas, poucas pessoas, um vento leve me empurra por novos caminhos. Ao virar uma esquina me deparo com homens trabalhando no conserto de uma tubulação qualquer. Domingo, infelizmente, também é dia de trabalhar. Homens com olhares distantes como se fossem máquinas programadas para trabalhar sem pensar em mais nada. Homens autômatos, homens de uma sociedade que cumpre rigorosamente suas tarefas, sem questioná-las, sem buscar novas formas de atuação. Observo por algum tempo aquele grupo de trabalhadores, todos eles não olhavam para os lados, estavam concentrados em suas funções, não havia uma risada, eles trabalhavam em absoluto silêncio a espera do final de seus expedientes.
     A cidade já estava mais desperta. Nas ruas a vida já pulsava. Pessoas caminhando com seus cachorros. Famílias indo às compras para os almoços de domingo e eu apenas caminhado sem rumo. Olhando o desconhecido e cada vez mais intrigado com tudo isso que me cerca, tentando entender as dinâmicas da vida. Não há lógica no viver. Vamos apenas vivendo, buscando ser felizes. E somos felizes. Felicidades particulares, com suas especificidades. Não há uma felicidade única para todos. Cada um de nós e feliz do seu jeito.
     Em cada casa começava a tarefa de todos os domingos. A fumaça a invadir as ruas. As famílias reunindo-se em torno das churrasqueiras, fazendo seus assados dos finais de semana, churrascos, galetos, enfim, vão apenas vivendo mais um domingo como tantos outros. E isso que é o interessante em nossas vidas. Repetimos comportamentos, repetimos quase à exaustão e mesmo assim somos felizes. Como entender? Não é para ser entendido, é assim porque é assim.
     Quase chegando em casa passo por uma daquelas televisões de cachorro. Frangos sendo assados e o cheiro típico no ar. Aquele cheiro é o que identifica os domingos para mim. Não consigo passar um domingo sem sentir este aroma típico. Me sinto novamente de volta à realidade. E agradeço sentir novamente a vida pulsar normalmente como deve ser os domingos de todos nós...


Trilha sonora:
Journeyman - Jethro Tull - Heavy Horses
Sublime - Muse - Arcana
Darkness - The Police - Message in a Box
Karn Evil 9 (3rd Impressin) (California Jam Festival 1974) - Emerson Lake And Palmer - Beyond In The Beginning
Lemon - U2 - Zooropa
A Fifth Of Beethoven - Walter Murphy and The Big Apple Band - Rock 70´s
Get Off of My Cloud - The Rolling Stones - The Best Of
Peggy Sue - Buddy Holly - Rolling Stone Magazine's 500 Greatest Songs Of All Time
Law Years - Pat Metheny, Dave Holland & Roy Haynes - Question and Answer
Toad In The Hole - Ian Anderson - Walk Into Light
So cruel - U2 - Achtung Baby
Radio (Unplugged) - The Corrs - Best Of The Corrs
Into The Heart - U2 - Boy (2008 Remaster)
The Chequered Flag (Dead Or Alive) - Jethro Tull - Too Old To Rock 'n' Roll: Too Young To Die!
Stray Cat Blues - The Rolling Stones - Get Your Leeds Lungs Out, Revisited - Leeds, England
Los Languis - Soda Stereo - Doble Vida
Fire - U2 - October (2008 Remaster)
Bad Love - Eric Clapton - Greatest Hits - Vol I
Shine On - Peter Frampton - Frampton Comes Alive

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Somos 99%

     Somos uma parcela significativa de qualquer sociedade. Somos os 99%. Apesar de sermos a imensa maioria, ainda assim somos excluídos de quase tudo. Somos chamados somente quando os detentores das riquezas, os outros 1%, precisam de nossos sacrifícios.      Como é possível que uma sociedade, com alicerces tão frágeis, fique de pé por tanto tempo? Não tenho a resposta. Entretanto, sinto que algo está mudando e muito rapidamente. Esta sociedade injusta já não está mais tão firme e começa a ser questionada. Nos últimos meses estamos acompanhando vários movimentos sociais espraidos pelo mundo. É a voz dos 99% se fazendo ouvir. Estamos cansados de sacrifícios intermináveis. E sempre dos mesmos para os mesmos. Nunca são chamados os detentores da riqueza. Um porcento da população nunca se sacrifica, mas quando aparece alguma dificuldade, criada pela ganância deles, colocam de lado suas convicções e imploram ajuda dos governos. Estes governos que sempre foram chamados de ineficientes ou

Vivendo ao largo da vida...

     - Eu vivo ao largo da vida.      - Como assim?      - Isto mesmo. Eu vivo costeando a vida. Nunca me senti incluído em nenhum grupo social. Nunca convivi com nenhuma turma. Sempre fui muito sozinho.      - Mas hoje somos um casal e temos alguns amigos.      - Sim, mas são muito mais teus amigos do que meus. E para dizer a verdade são apenas conhecidos.      - Otávio, às vezes acho que tu é louco.      - Por quê? Talvez porque eu goste de falar a verdade? Pelo menos a minha verdade.      - É. Nem sempre gostamos de ouvir verdades.      - Mas eu gosto de falá-las.      - Otávio, tu tem esta mania de falar o português correto. Isto, sim, me incomoda. E também me irrita esta tua vontade de falar verdades... Verdades não são para serem ditas.      - Isabele, olha o paradoxo desta tua frase...      - Para o que...      - Paradoxo. Para os menos acostumados com o vernáculo, paradoxo é uma especie de contrassenso, absurdo ou disparate.      - Tu e esta mania de me chamar de i

DSK, o homem "respeitável"

     Imaginem um homem poderoso. Um homem influente. Um homem "respeitável". Este homem entra num avião, se dirige à primeira classe, lugar onde sempre se acomoda quando viaja de avião. Afinal, é o todo poderoso, não existe outro lugar para este homem a não ser a primeira classe de uma aeronave. Pelo menos até então.      Mas antes de se deslocar até este avião, o "respeitável" senhor abusou de uma camareira do hotel de luxo onde estava hospedado. Muitos ao imaginar esta situação têm a certeza de que nada iria acontecer a este senhor poderoso, temos certeza de que ele iria para o seu destino e aquela camareira conviveria com esta chaga, ser abusada por um homem poderoso e nada poder fazer porquanto ninguém acreditaria nela. Mas não foi o que aconteceu nestes últimos dias nos Estados Unidos.      Muitos de nós criticamos os Estados Unidos. Na adolescência tínhamos como objeto da nossa ira este país imperialista. Afinal, éramos e ainda somos a parte do mundo explorada